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Por Maria Geane Magalhães, Restoration Steward de 2024 para zonas áridas, e Pedro Alace Santos, ganhador do prêmio CDKN de justiça climática.
Sistemas agroflorestais têm sido crescentemente apontados como uma alternativa viável ao paradigma extrativista representado pelo agronegócio latifundiário no Brasil.
Nós somos Maria Geane Magalhães e Pedro Alace Santos, dois jovens comprometidos com o desenvolvimento sustentável do nosso país. Juntamos forças para refletir sobre a realidade do movimento agroflorestal em dois biomas brasileiros onde lutamos pelo manejo ecológico da terra.
Um deles é a Amazônia, amplamente reconhecida como uma das florestas tropicais mais importantes do mundo, localizada no norte do país, e o outro é a Caatinga, um ecossistema semiárido muito menos discutido em nível internacional, localizado no nordeste do Brasil.
Ao refletir sobre a adoção de agroflorestas em biomas tão distintos, fomos rapidamente lembrados de que os sistemas agroflorestais não são soluções homogêneas que podem ser aplicadas uniformemente a diferentes ecossistemas.
Na realidade, seu poder como alternativa para proteger a biodiversidade está na adaptação dos princípios agroflorestais às circunstâncias e aos ecossistemas locais.
No contexto brasileiro, os sistemas agroflorestais surgem inicialmente como tecnologias ancestrais entre comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas, que desenvolveram suas práticas de forma empírica e intuitiva.
Buscando estabelecer sistemas produtivos que respeitassem o meio ambiente e a biodiversidade local, bem como proteger a segurança e a soberania alimentar, as comunidades locais co-criaram práticas complexas de plantio adaptadas às circunstâncias locais.
Elas fizeram isso de forma independente, muito antes do desenvolvimento científico ou acadêmico da agrofloresta como disciplina.
Esses sistemas agroflorestais são caracterizados pelo uso de recursos naturais e práticas de gerenciamento em que as espécies florestais são usadas em arranjos produtivos com culturas agrícolas.
Ao adotar práticas agroflorestais, os agricultores podem não apenas melhorar a produtividade de suas terras, mas também contribuir para a conservação ambiental e a sustentabilidade de longo prazo.
A agrofloresta também pode coexistir com a criação de animais na mesma área, facilitando as interações ecológicas que fortalecem a saúde do solo. A combinação de diversidade de culturas e matéria orgânica, que é essencial para a aplicação de sistemas agroflorestais, é fundamental para o funcionamento dos ciclos biogeoquímicos por meio da fixação de carbono no solo.
No Brasil, é fundamental garantir a fertilidade do solo e reter a água nesses solos, especialmente em tempos de crise hídrica e com a expansão dos incêndios florestais que afetam a maior parte do país.
Em nossos territórios na Amazônia e na Caatinga, os sistemas agroflorestais são alternativas para a produção de alimentos e forragens em harmonia com a natureza. Ao contrário das monoculturas e das práticas de agricultura industrial, os sistemas agroflorestais buscam preservar as espécies nativas de plantas, animais e fungos.
Os sistemas agroflorestais se concentram na saúde dos solos e das pessoas, contribuindo assim para aumentar a resiliência dos ecossistemas. Eles mantêm as atividades microbianas no solo, evitando a erosão e ajudando os solos a se recuperarem de distúrbios como incêndios, inundações, pragas e doenças.
Essa prática é essencial para a restauração de nossos ecossistemas, como defende o agroflorestor e Técnico em Agropecuária Gean Bastos, atuando no Quilombo Lagoas, na Caatinga:
“Os sistemas agroflorestais podem regenerar as características físicas, químicas e biológicas dos solos, implantando espécies-chave adaptadas à região, como aroeira, jucá, ypê umbuzeiro, palma, maniçoba, camaratuba, canafístula, ata e seriguela. Isso cria um ambiente biodiverso e restaura o equilíbrio do meio ambiente.”
Além disso, em nossa experiência, sistemas agroflorestais oferecem um caminho viável para assegurar a segurança e soberania alimentar de nossas comunidades, se mostrando como uma alternativa frente aos monocultivos que avançam sobre os territórios.
Essa busca por alternativas é particularmente importante para o nosso país, uma vez que os biomas brasileiros perdem terreno diariamente para o desmatamento, causado, em sua maioria, pelo avanço das monoculturas e da pecuária.
Essas atividades, que estão ligadas ao complexo socioeconômico do agronegócio, são realizadas por grandes corporações que buscam explorar nossos solos para a produção de commodities e o enriquecimento desigual de uma pequena elite econômica.
Devido às suas características únicas, a Caatinga, bioma exclusivamente brasileiro, apresenta um importante estudo de caso para o avanço da agrofloresta e da restauração no país.
Apesar dos desafios socioeconômicos e climáticos que contribuem para sua destruição, a Caatinga continua sendo um espaço com uma rica diversidade de espécies vegetais e animais e uma área de grande potencial produtivo.
Infelizmente, cerca de 46% da vegetação original da Caatinga já foi desmatada. Isso evidencia um conflito sobre a propriedade da terra entre os latifundiários, que se concentram na agricultura industrial e em grandes projetos de infraestrutura, e os agricultores familiares, que buscam construir sistemas alimentares diversificados com base na produção em lotes menores de terra.
Como na maior parte do mundo, os pequenos agricultores familiares são os mais afetados por esse cabo de guerra no Brasil. Isso destaca a necessidade urgente de adotar o novo paradigma da agrofloresta para o manejo da terra na Caatinga, que permite tanto a inclusão social quanto a preservação do ecossistema.
Os produtores locais estão adotando cada vez mais essa alternativa à medida que buscam transformar a relação entre suas comunidades e seus territórios, conforme mencionado pelo agricultor Manoel Aragão, do Quilombo Lagoas, na Caatinga Piauiense:
“A iniciativa de adotar a agrofloresta tem o objetivo de produzir alimentos saudáveis e preservar as plantas da caatinga, assim como conservar o solo para que se mantenha produtivo” .
Da mesma forma, na Amazônia, os conflitos de terra são evidentes diariamente, com a crescente devastação da floresta para a expansão do agronegócio e da mineração.
É aí que entram os sistemas agroflorestais. Na Amazônia, eles são geralmente entendidos como simulações dos arranjos naturais das florestas nativas, que são naturalmente diversificadas e altamente produtivas. Além de representar um caminho para o desenvolvimento sustentável e a conservação do ecossistema, a agrofloresta amazônica é praticada principalmente por famílias para garantir seu sustento e produzir alimentos para consumo próprio.
Existem várias estratégias de gestão para otimizar os recursos e os serviços ecossistêmicos da Amazônia. Devido à extensão e à complexidade do bioma, a agrofloresta também deve ser adaptada às especificidades de cada sub-região.
Tanto na Caatinga quanto na Amazônia, uma das principais estratégias para conservar nossos biomas e construir meios de vida sustentáveis é a diversificação dos arranjos produtivos.
Essa consciência é amplamente difundida entre os produtores agroecológicos que trabalham com agroflorestas no Quilombo Lagoas, na Caatinga do Piauí, como defende a agricultora Nadir Santos Marques:
“Plantar agroflorestas pode salvar animais e plantas em risco de extinção, conservando as plantas existentes na Caatinga e produzindo uma diversidade de alimentos’’.
Em ambos os territórios, a agrofloresta também pode mitigar os efeitos da crise climática. Esse é o caso tanto da Caatinga, que é um bioma naturalmente semiárido, quanto da Amazônia, que, apesar de seu clima quente e úmido, também vem passando por períodos de seca, temperaturas extremas e desregulação na distribuição das chuvas.
Os efeitos da crise ambiental já estão sendo sentidos em nossos territórios, dificultando a transição para a agrofloresta. Deise Alves, agricultora da Agrovila Itaqui, no estado amazônico do Pará, explica o impacto da crise climática na agricultura:
“Atualmente, minha principal dificuldade é a questão climática, principalmente porque há pouca chuva. A água que vem não é suficiente, e isso prejudica o desenvolvimento das plantas e o crescimento da produção na propriedade.”
O modelo dos sistemas agroflorestais, assim como práticas agroecológicas, também apresenta alternativas para que os jovens agricultores permaneçam em suas comunidades.
Os jovens rurais da Caatinga, da Amazônia e de todos os outros biomas brasileiros estão sob constante pressão econômica para migrar para as cidades devido à crescente expansão da agricultura industrial altamente mecanizada, que está criando cada vez menos empregos para os jovens.
Ao valorizar as culturas locais, diversificar as culturas e aumentar a renda da agricultura familiar, a agrofloresta pode emergir como uma importante estratégia para permitir que os jovens rurais permaneçam em suas comunidades, proporcionando aos agricultores maiores oportunidades de geração de renda.
Esse potencial, no entanto, é prejudicado pela falta de políticas públicas que incentivem a implementação de sistemas agroflorestais, como o crédito rural e a pouca ou inexistente assistência técnica e serviços de extensão rural para atender às demandas dessas comunidades.
Por outro lado, o agronegócio de larga escala sempre foi subsidiado pelo governo brasileiro sob o pretexto de “desenvolvimento”. Como exemplo, somente em 2024, o governo federal alocou mais de R$ 400 bilhões (US$ 72,9 milhões) para o financiamento de empresas rurais, enquanto os pequenos agricultores receberam apenas cerca de R$ 85,7 bilhões (US$ 15,6 milhões).
Em contraste, as práticas agrícolas ecológicas, como a agrofloresta, oferecem alternativas à destruição causada pelo agronegócio.
No contexto da crise climática, política, econômica e social global, essa alternativa agroflorestal não é apenas viável, mas urgente.
Os sistemas agroflorestais desempenham um papel imensurável na regeneração de áreas degradadas, na manutenção das florestas e na produção de alimentos para o homem do campo.
Mas os biomas brasileiros, como a Amazônia e a Caatinga, têm sido epicentros da destruição ambiental e estão clamando por estratégias de restauração mais fortes e pela transformação dos agroecossistemas.
Por meio de ações agroflorestais lideradas pela comunidade e da implementação de políticas públicas para proteger a Amazônia e a Caatinga, os sistemas agroflorestais têm o potencial de salvar o futuro de nossos territórios.
Em nível global, acreditamos que uma revolução agrofloresta é necessária para defender a biodiversidade do planeta e produzir e distribuir de forma justa alimentos saudáveis.
A agrofloresta é mais do que uma alternativa. É a nossa esperança coletiva de dias melhores para camponeses e camponesas no Brasil e no mundo.
Finally…
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